Bullying


 Aconteceu-me algumas situações, que uma das últimas fez-me relembrar alguns momentos da minha adolescência. Ontem, após uma situação extremamente estressante para mim. No caminho de casa, lembrei-me de passar por um supermercado que usualmente não vou. Pois fica um pouco mais distante da minha localidade. Mas eu precisava de comprar umas sapatilhas para a minha bebé, que não encontrava em lado algum e alguém recomendou-me procurar no tal supermercado “Tesco”. 

Eu já sensível, porque estava a vir do hospital com a minha bebé, assim que entrei na porta senti um ligeiro incomodo com a música muito alta, mesmo com os meus fones de cancelamento de ruído. Tentei entao, procurar rapidamente o queria e quando cheguei a um corredor de roupa deparei-me com duas funcionárias que estavam a arrumar. Eu nervosa com a música, as duas empregadas e o facto de estar a procurar o número de sapatilhas que queria para a minha filha, comecei a baloiçar ligeiramente. Ouvi uma gargalhada mas pensei para os meus botões “não sei do que riem mas não deve ser para mim! Provavelmente alguma piada!”,pensei. 

Encontrei as tais sapatilhas, peguei e foi para o outro lado procurar os calções de lycra que também precisava para a minha filha mais velha, já um pouco confusa deparei-me que por duas vezes passei no mesmo sítio (ou seja eu andei às voltas). As funcionárias riram-se novamente. Já não achando muita piada, continuei a pensar que não era para mim. 

A música parou por meros segundos e eu disse em voz alta “Thanks God!” (Obrigada Deus), foi como uma sensação de alívio. Elas voltaram-se a rir e nisto uma delas disse, (acho eu, que ela estaria a imaginar que eu nao conseguiria ouvir, uma vez que tinha os fones): “Eu também vou aplicar para ter deficiência, acho que sou meia surda!”. Ainda hoje continuo sem entender o porque daquele comentário?! Por eu usar os fones? Ou será porque teria o cartão de deficiência comigo? Mistério! O que é certo é que elas voltaram a rir-se e eu furiosa olhei para elas querendo as bater! Mas não o fiz, acho que elas sentiram que eu percebi e mudaram radicalmente a expressão. 

Queria fazer queixa imediatamente ao manager, mas tava tão sobrecarregada que simplesmente paguei e fui embora. Dando o tal clique da minha adolescência, lembrei-me do quanto eu sofria, do eu passava quando enfrentava situações de estresse e/ou estava mais sensível. Lembro-me inclusivamente de alguns colegas apontarem o dedo para mim chamando-me de deficiente!  Hoje em dia já não me incomoda, mas na altura sentia-me totalmente diferente dos outros. Isso fazia me muitas vezes ficar tão diferenciada que eu acabava por me afastar de tudo e todos. Fechava-me no meu quarto, onde eu pretendia que as minhas bonecas era as minhas amigas. Mais tarde a partir dos 12 mais ou menos comecei me a “misturar” com as meninas “mal comportadas”, porque eram as únicas que me aceitavam da forma que eu era. Mas elas acabaram por me começar a fazer muitas perguntas que me faziam ficar totalmente descontrolada, até que um dia eu descontrolei-me totalmente! Atrás da escola comecei aos berros para me deixarem em paz! Só me lembro de ver elas a rirem-se e a apontar-me o dedo! E de repente, apaguei! Não me lembro absolutamente de nada! 

Pelo que a minha mãe contou tive uma crise epiléptica, outra vez! Mais uma vez ficava em casa entre uma semana pelo menos! Mas as vezes mesmo após a semana eu não tinha força alguma. Os médicos não entendiam o porque de eu levar tanto tempo a recuperar-me, tudo era “tão normal” que eu faltava montes de vezes a escola. Após esse incidente, quando regressei a escola durante o meu recreio outra vez levei com bullying! Onde um miúdo se deitava no chão, e balouçava-se gozando com os comportamentos que eu tinha durante a crise epiléptica.  Por de trás de toda as crises, estaria também o abuso que levava muitas vezes em casa e o bullying na escola. Foi então que eu resolvi acabar com tudo! 

Planeei com cuidado o meu suicidio, que por obra de Deus não correu certo! Após o internamento no hospital São João, eu fui referênciada para psiquiatria mas eu nunca mais quis voltar para a escola! Sempre que a minha mãe tentava eu virava um “bicho violento” e ninguém me segurava. Foi então que a minha mãe resolveu me colocar a trabalhar e “eu nem olhei para trás!”  Eu adorava aquilo, lavar pratos, sim! Ninguém me chateava! Tava no meu canto em paz. 

Mas claro, hoje sei que isso tudo trouxe graves consequências na minha vida! E gostaria também de deixar aqui o meu parecer, eu não tenho contacto com qualquer pessoa dessa altura. Mas não sei até que ponto uma criança poderá ter sucesso na vida humilhando os outros?! Não me parece! Muitas vezes aquela criança comporta-se de forma inadequada porquê? Aí está a questão que gostaria de perguntar a muitos profissionais que me acompanharam. Terão eles investigado a situação?! 

Não se esqueçam que, tudo que vocês tolerarem os vossos filhos a fazerem é o que iram receber! Então se ensinar a respeitar, a grande chance e que o seu filho irá respeita-lo! Se ensinar a criticar o próximo, é bem provável que a sua criança cresce a não dar reconhecimento ao seu trabalho! E aos pais de autistas, muito amor e paciência! 

Lembre-se de tratar qualquer ser humano como gostaria que lhe tratassem e ensine isso aos seus filhos. A ajudar o próximo e a respeitar todas as diferenças. 

Pense nisso! 


Quanto a situação do supermercado eu apresentei queixa, possivelmente as funcionárias serão transferidas para outra secção e noutra reclamação serão demitidas por justa causa! Em UK, a legislação é clara contra a descriminação e inclusão de pessoas com deficiência. Quando afectado na mentalidade e vida do individual pode até levar a uma penalização! 

Em Portugal:

Código Penal do Decreto-lei n.48/95 do Artigo 240 (Entrada alterada em vigor: 2017-11-21), d) diz claramente que é ilegal inicitar violência ou ódio contra a pessoa ou grupo de pessoas independente da raça, cor, origem étnica ou nacional, ascendência, religião, sexo, orientação sexual, identidade de género ou deficiência física ou psíquica; com consequência poderá ser punido/a (os/as) com pena de prisão de 6 meses a 5 anos.

Código Penal do Decreto-lei n.46/2006 de 28 de Agosto. Proíbe e pune a discriminação directa ou indirecta em razão da deficiência e da existência de risco agravado de saúde 

Fonte:

https://dre.pt/legislacao-consolidada/-/lc/107981223/201708230100/73474163/diploma/indice

https://dre.pt/pesquisa/-/search/540797/details/maximized

Foto retirada do Goggle

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